Melãozinho

Sou uma pessoa bastante envergonhada, mas há um bom tempo luto para que essa vergonha não me impeça de fazer nada. Fiz teatro, dancei no palco, tentei ser comediante, falei outras línguas, me tornei professor. Foi ficando mais fácil, mas nunca fica totalmente fácil. Tenho isso como uma conquista pessoal e, portanto, tento também incentivar esse comportamento em meus alunos. Já toquei violão em aula, morrendo de vergonha, sabendo que iria morrer de vergonha, apenas para tentar mostrar que tudo bem.

Há alguns anos, com a chegada do Samuel, e, mais recentemente, com a chegada da Isabel, me esforço para dançar com eles, cantar em público, não ficar constrangido em sair fantasiado ou com as “tatuagens” que o Samuca pinta em nós e tantas outras situações que poderiam me deixar envergonhado. E tem sido muito gostoso.

Na festa de aniversário do Muca, fizemos um palquinho para todos que quisessem pudessem tocar e cantar. Meu pai preparou uma divertida versão da música do Caetano adaptada ao Samuca: “Gosto muito de comer melãozinho”, que acaba ainda homenageando o Max, nosso amigo e dono da frutaria que se tornou, logo cedo, um dos passeios preferidos do Samuel.

Foi só depois de ver meu pai cantando essa música lá no palco, mesmo com vergonha, que percebi que essa luta racional para não deixar que a vergonha limite minhas possibilidades tinha também uma história. A paternidade é em grande parte para mim uma experiência refletida, a experiência de ser filho não. Às vezes, pensando na paternidade que eu gostaria de construir, aparecem bonitas surpresas sobre a experiência de ser filho também.


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