Mitologia: Ícaro

A única história mitológica que contei para o Samuel, até agora, foi a de Dédalo e seu filho Ícaro, que construíram um labirinto tão complexo que não conseguiram sair. 

Me atrapalhei logo de início, já que o Muca não sabe o que é um labirinto, até que percebi que não importava muito e foquei em dizer que estavam presos – experiência que toda criança entende muito bem. Encurralados, como vocês devem lembrar, eles construíram asas com cera de abelhas e penas e se libertaram pelo céu. Ícaro, porém, contrariou as orientações do pai e voou perto demais do sol, suas asas derreteram e ele caiu no mar. 

Apesar do Muca estar bem desobediente ultimamente, não contei a história para dar lição de moral. Gosto mesmo é de imaginar Ícaro voando, abrir os braços e ficar imitando. Acho que o ele gostou bastante também, porque toda vez que vê pássaros, diz que estão voando "lá no sol". Acho bonito. Torço para não caiam.

Mas sabe o que me pega nessa história, como pai? Que antes de voar, Ícaro ficou encurralado. O Samuel, assim como qualquer pessoa, sobretudo as recém-chegadas, cria muitos labirintos dos quais não consegue sair: colocar o chinelo, comer com as próprias mãos, tirar a roupa sozinho antes do banho, pedalar a bicicleta... E, nessas horas, meu impulso é fazer por ele.

A Mari, que entende das pedagogias Montessori, me ensinou a deixar que ele experimente os problemas e crie soluções próprias. Eu estou tentando, mas imagino mesmo é o Ícaro preso. Me ajuda. Fico pensando que se tirar ele do labirinto, talvez ele não aprenda a voar.

Depois imagino o Chaplin, porque a solução sempre gera outro problema, mas aí já demorou muito e, a Montessori que me perdoe, vale a pedagogia do relógio de ponto. São os tempos modernos.

Samuca e Bebel - um site sobre infância, paternidade e tudo que acontece nessa relação entre pais e filhos. Escrito por Caio Moretto Ribeiro.

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