Dia do índio
Sabe que o "dia do índio" não foi tão ruim quanto meu lado antropólogo esperava? O Samuca veio para casa vestindo um cocar feito na escola e achou bem divertido. No dia seguinte usou de novo. E foi isso. Um cocar e alguma curiosidade.
Mas do dia do índio para cá assistimos a diversos ataques aos povos indígenas no Brasil: do massacre do povo Gamela no Maranhão à instauração de uma CPI para determinar quem é "índio de verdade", voltando a misturar raça e etnia como nos piores momentos da humanidade. Tudo isso tem mexido bastante com a gente e resolvemos dar um pouco mais de atenção ao assunto.
Talvez vocês não se lembrem do caso, mas com tudo isso acontecendo, a imagem daqueles moleques que queimaram o índio
pataxó Galdino Jesus dos Santos em 1997 voltou para me atormentar esses
dias. Fiquei imaginando se meus alunos fariam alguma atrocidade dessas e
logo me peguei pensando em meus filhos. Adorno já me convenceu, há
algum tempo, de que um dos imperativos morais da educação das crianças
deveria ser a construção das condições subjetivas necessárias para que o
holocausto nazista jamais se repita. Ora, e qual é a diferença entre o
genocídio do povo judeu ou do povo Gamela e dos outros povos ameríndios?
Começamos a ler, desde então, o livro Uma arara e sete papagaios, que já virou o favorito da hora de dormir. O livro conta a história de Poti, que leva para a taba uma arara tagarela que deixa todos loucos. Numa dessas leituras, o Samuel me perguntou se o Poti também tinha um elefante de pano para dormir e
outras coisas do tipo. Aproveitamos a brecha.
Conversando com uma amiga sobre isso, descobrimos que haveria um evento dos Sabuká Kariri-Xokó aqui pertinho e fomos participar. No carro, o Samuca estava um pouco apreensivo, falando que ia ficar com medo e que não ia gostar, o que nos fez refletir sobre o imaginário negativo que podemos acabar construindo sem querer. Chegando lá foi tudo bem tranquilo. Teve oficina de artesanato, cantos e um monte de criança brincando, jogando bola e sendo criança. Ele se entrosou sem grandes dificuldades e foi muito gostoso.
Não acho que a gente precise conhecer tudo sobre todos os povos, mas em tempos de banalização do genocídio, para mim, ver que o Samuel estava entre crianças Kariri-Xokó foi emocionante, porque acho que nesse ponto e nessa idade a lição não é intelectual. Não se trata de reconhecer as diferenças, mas de aceitá-las e de conviver com elas.
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